NOSSAS VISITAS |

|
 |
|
Entrevista a
IstoÉ Gente - Edição 280
Sem vontade de voltar a filmar, Jabor
lança livro com crônicas afetivas, fala de seus três casamentos,
elogia Lula, mas critica os projetos do governo para o cinema.
Texto: Luís Edmundo Araújo
Nas crônicas que escreve para nove jornais e nas aparições semanais
no Jornal Nacional, Arnaldo Jabor, 63 anos, costuma adotar dois
estilos básicos. Ou aborda, com a seriedade necessária, assuntos
como a eleição de George Bush nos Estados Unidos e a violência no
Rio de Janeiro, ou se deixa levar pela delicadeza e o afeto capazes
de inspirar tanto um texto em homenagem ao avô quanto reflexões
sobre o universo feminino. Reunidas pela editora Objetiva no livro
Amor É Prosa, Sexo É Poesia, as crônicas do segundo grupo já
venderam 40 mil exemplares desde o lançamento, no final de novembro,
e estão em primeiro lugar na lista dos mais vendidos de não ficção
publicada por Gente. O sucesso rendeu até a fama de símbolo sexual
ao pai da cineasta Carolina, 29, diretora da Conspiração Filmes, da
antropóloga Juliana, 26, e de João Pedro, 5. Casado três vezes,
atualmente está namorando, mas não quer se aprofundar muito nesse
assunto.
De onde surgiu a idéia do livro?
Foi uma idéia da Isa Pessoa, editora, de reunir meus textos mais
nostálgicos, afetivos e relacionados com a sexualidade. Acho que as
pessoas, principalmente as mulheres, estão muito carentes de amor,
mas não no sentido de mulher, homem. Estão carentes de um pouco mais
de gentileza, de delicadeza na vida, porque o Brasil está muito
barra pesada, está uma guerra. Então dá uma fome de carinho, de
amor, paz.
O livro é um contraponto ao excesso de erotismo que você costuma
criticar?
O problema não é bem excesso de erotismo, mas a supervalorização da
sexualidade como uma coisa milagrosa, mitológica. Nos anos 60, 70, a
sexualidade era uma coisa política, importante, os direitos da
liberdade sexual, a pílula. Hoje virou uma coisa meio vulgar, porque
já pode tudo. Virou um exibicionismo, uma espécie de salvação. A
única salvação é a sacanagem. Você pega as revistas que mostram as
celebridades, como a IstoÉ Gente, e o cara casa um dia, depois
separou, já mudou de mulher. É um harém rotativo de homens e
mulheres. Pode ser até que eu esteja com inveja, mas é uma coisa
muito louca.
Inveja? Mas você não tem sido apontado como símbolo sexual, não foi
casado três vezes?
Imagina, eu, símbolo sexual? E casamento é sofrimento, não é sexo.
Quando separa dá um trabalho danado. Já fui casado três vezes, são
três sofrimentos, não é brincadeira. Quem sabe curtir são esses
garotões que não casam e ficam comendo todo mundo.
Como foi a experiência de fazer uma música com Rita Lee (a crônica
que dá título ao livro virou sucesso da cantora)?
A Rita leu a crônica, adorou, me ligou e disse: “ Jabor, vamos fazer
uma música com essa letra?” Topei e ficou do cacete, adorei. Conheço
a Rita há muito tempo, mas nunca tinha feito música com ela, é minha
primeira letra. Já fiz muita coisa na vida, mas música ainda não
tinha feito. Agora estou com vontade de fazer outras com a Rita.
E cinema, tem vontade de voltar a fazer?
Por enquanto, não. Descobri que sou mais jornalista do que cineasta.
Gosto mais de escrever do que de filmar. Não tenho mais saco para as
aporrinhações que antecedem e sucedem o cinema. Fazer o filme eu
gosto. Não gosto da aporrinhação que vem junto, a captação, o
lançamento, distribuição. E acho que faço uma espécie de cinema
pessoal, particular. Falo para 50 milhões na tevê, faço
performances. Mas minha filha, Carolina, filma muito melhor que eu.
Ela pede conselhos?
Eu é que peço. Quando tenho alguma dúvida sobre cinema, ligo para
ela. A Carolina sabe tudo. Essa juventude é craque. Eu levo esporro
das duas filhas. Uma, que é antropóloga, me diz para não falar
bobagem. A outra é cineasta e filma melhor que eu. Acho ótimo, os
filhos têm que ser melhores que os pais. Tenho também um filhinho do
5 anos, o João Pedro, que mora em São Paulo com a mãe.
Qual a sensação de ter sido pai aos 58 anos?
É uma vertigem, e filho homem é uma coisa maravilhosa, porque ele se
identifica com você. Você vai fazer a barba, ele quer fazer também.
Você ensina a fazer xixi, a dar as três batidinhas, é um barato.
Estou completamente apaixonado pelo João Pedro, que é um menino
extraordinário. Deu uma luz na minha vida. Não posso morrer já, é
aquela história de acompanhar o crescimento dele.
Tem se cuidado mais?
Claro, faço exercício, estou querendo emagrecer mais, porque ainda
estou gordo. Faço ginástica, como comidas leves, não fumo, não bebo.
Quero viver bastante para ver esse menino adulto, para orientá-lo,
ajudá-lo a crescer nesse mundo mau. Ele é um alento de vida.
Quando aderiu ao jornalismo?
Comecei a escrever há 12 anos, na Folha de S. Paulo, porque estava
duro. O cinema brasileiro tinha acabado por causa do Collor, fiquei
passando fome. Esse apartamento aqui (na Lagoa, um dos pontos nobres
da zona sul carioca) estava hipotecado e não tinha dinheiro para
pagar a hipoteca. O Babenco (cineasta Hector Babenco) me emprestou
US$ 10 mil e vivi cinco meses com esse dinheiro. Arranjei um emprego
na Folha, mudei para São Paulo, depois passei a escrever para outros
jornais e começou a melhorar. Mas fiquei mal. Estava com 49 anos,
com sete filmes no currículo, premiado em festivais como Cannes e
Berlim, e sem dinheiro para dar às minhas filhas, para pensão.
O que acha do cinema brasileiro após a retomada?
É um barato. O cinema que se faz agora no Brasil é muito bom,
técnica e esteticamente. Os mais moços têm uma relação com o cinema
mais dinâmica, atualizada. E tem filmes fantásticos, desde Cidade de
Deus, Deus É Brasileiro, Carandiru, esse Contra Todos, do Roberto
Moreira, os filmes do Guel Arraes, esse Ônibus 174, que é uma
obra-prima. Uma coisa maravilhosa. Aí vêm esses chatos encher o saco
com esse negócio da Ancinav.
É contra a Ancinav (Agência Nacional de Cinema e do Audiovisual,
criada pelo governo Lula)?
É o lado bolchevista do governo Lula. Os caras querem controlar a
realidade, coisa que o Lula jamais fez. Ele não é burro de achar que
realidade se controla, mas esses caras têm a velha mentalidade
leninista de fiscalizar, controlar, censurar. A Ancinav é
desnecessária. Já tem legislação, já tem tudo, isso aí é o cara que
entra e diz: “Agora eu vou controlar esse negócio”. É o Juca
Ferreira (secretário-executivo do Minc), o Orlando Sena (secretário
do Audiovisual).
O governo não deve se meter no cinema?
O cinema hoje se faz livremente, em associação com vários grupos,
até com empresas estrangeiras. Não tem mais aquele papo estatista. O
Estado pode ajudar com subsídio, dar força, mas não pode ser um
escritório dizendo qual filme vai ser produzido. Isso é coisa da
antiga União Soviética.
Como avalia o desempenho de Gilberto Gil no Ministério da Cultura?
O Gil é ótimo, um grande artista, mas politicamente é meio ingênuo,
se deixa controlar por uns comunas lá do Ministério. Ele deve estar
fazendo coisas boas, mas esse negócio da Ancinav é um bode que
jogaram no colo dele. Logo o Gil, um dos líderes da liberdade de
criação no Brasil, que foi expulso do País pelos militares, teve que
passar três anos em Londres. O Gil é uma flor. Não o estou
criticando, mas acho complicado como ele se deixou envolver. O Gil
tinha que estar preocupado, por exemplo, com o candomblé, que está
sendo exterminado pelos evangélicos na Bahia. Não ficar preocupado
se a Globo vai exibir qual filme, quantas vezes, ou como o cinema
brasileiro tem que ser. Isso é antidemocrático.
Qual sua opinião sobre o governo Lula?
Vi o filme do João Moreira Salles sobre o Lula (Entreatos). É
impressionante como ele é superior aos seus correligionários. O Lula
é intuitivo, tá vendo tudo acontecer. O Palocci (Antônio Palocci,
ministro da Fazenda) é outro cara admirável, mas o Lula sabe tudo. O
filme mostra como ele é inteligente. Os caras falando bobagem e ele
rindo, sacando. Aí quando resolve falar só diz coisas boas. É ótimo
o discurso político do Lula. Acho-o pessoalmente muito bom.
|
|