O TEMPO - PARTE III |
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Aquele Abraço
Sincero e Emocionado por D. Ruth
Publicado em: 01/07/2008
Lula e FHC juntos e a entrevista de Carvalho
Minhas mãos andam pesadas. Ao escrever sobre a política brasileira,
meus dedos tremem, uma nuvem de desânimo cobre-me a cabeça. Falar o
quê? Tudo bate no muro do castelo deste governo, numa trincheira
defensiva, ocultando informações. Ainda impera no Planalto restos de
uma cepa herdada do velho autoritarismo bolchevista, cruzada com o
germe do sindicalismo oportunista e populista, formando um novo tipo
de micróbio que se espalha no organismo do Estado.
Essa doença é dissimulada pelo
carisma de Lula em simpático getulismo pós-moderno.
A obsessão paranóica da "conspiração" cria mecanismos de defesa que
impedem um real contato com a opinião pública.
"Mas, porém, contudo, todavia", nestes dias tristes, houve dois
fatos que me comoveram: o abraço de Lula em FHC, no velório de d.
Ruth, e a entrevista de Gilberto Carvalho nas páginas amarelas de
"Veja". Explico por que.
Mas, antes, faço um parêntesis sobre minha vida sexual com Lula.
Muito burguês idiota me cumprimenta na rua como se eu tivesse
nascido com a missão de malhar o Lula. Não é assim - tenho outros
ideais... (muitos outros idiotas vão se eriçar e dizer que estou
virando a casaca.)
Já votei em Lula contra o Collor e defendi seu governo até 2004/5
(podem olhar meus artigos), primeiro contra a gangue dos quatro
carbonários que queriam fazer a "revolução" socialista e que o PT
expulsou. Até o Dirceu eu cheguei a defender (!) até o caso do
Waldomiro, quando me toquei. Só fui "cair de pau" mesmo quando
explodiu o mensalão, quando o Roberto Jefferson abriu a cortina do
bordel e expulsou os bolchevistas que envolviam o Lula em uma teia
de picaretagens político-ideológicas, lideradas pelos comissários do
povo que, graças a Deus, caíram.
Critiquei também seu "não sei de nada". Hoje, minha pobre indignação
(quem sou eu?) é contra o sindicalismo pelego que se infiltrou em
100 mil buracos do Estado, minha raiva é contra o uso da máquina
para o populismo na mídia, contra o aumento de gastos públicos,
usando mal os bilhões de dólares que entram, contra o aliancismo com
os piores canalhas da nação. Muito bem.
Acontece, senhores, que a inflação está despertando. Em vez de ser
usada, a economia mundial bombando, está sendo abusada como uma
droga entorpecente. Pela ausência de projetos, resta aos donos do
poder manter comprado o apoio das "massas" com bolsas família, e
aumentar os gastos públicos em contratações e falsas iniciativas.
Tudo que o governo anterior introduziu e que poderia nos fazer
avançar foi paralisado, pois "reformas" repugnam os
"revolucionários". E Lula está preocupado, porque seu prestígio pode
ruir. Para além do sobe-e-desce dos juros, as medidas eficazes
contra a inflação são óbvias, conhecidas por qualquer economista. Se
Lula não quiser, por causa do ano eleitoral, interesses populistas,
chantagem de tortos aliados, se Lula não quiser, nada será feito e o
dragão vai atacar de novo.
O abraço
Aí, no meio da depressão do velório, aconteceu aquele abraço. Foi
sincero e emocionado: FHC e Lula estavam de novo juntos,
distribuindo panfletos no ABC. Ali, se deu uma mágica e brevíssima
coalizão, graças a d. Ruth.
Ficou claro: Lula gosta de FHC e FHC, de Lula. Sim. Nesses anos,
Lula aprendeu muito com a sensatez e a cultura de FHC e, por outro
lado, Lula influenciou a fundação do PSDB, sim; pasmem, mas a
social-democracia espontânea de Lula e a fundação do PT ajudaram a
fazer o ninho dos tucanos. Infelizmente, o PT foi logo loteado por
bolchevo-dirceuzistas sem bandeira e emprego desde 68.
Em seguida, leio na "Veja" desta semana a entrevista de Gilberto
Carvalho, chefe de gabinete de Lula. Através de suas respostas,
tomamos conhecimento de alguns assuntos considerados "secretos":
reações do presidente, suas preocupações principais, suas opiniões
sobre Dirceu, Palocci, Meirelles, PT. Pela primeira vez, ouviu-se a
voz do Executivo, sem mecanismos de defesa, com uma sincera
franqueza. Certamente, será criticado por "cumpanheiros" paranóicos
e oportunistas, mas, na entrevista, há indícios de uma disposição
mais bipartidária, mais cooperativa e aberta a um diálogo com a
opinião pública.
Aquele abraço e essa entrevista talvez anunciem que está na hora de
gestos novos, atos inéditos, saltos qualitativos dentro de uma
política que não pode continuar apenas com cacoetes soviéticos, com
marketing na TV e com um programa de governo que parece um
ensopadinho de sindicalismo com um desenvolvimentismo vulgar. O
perigo da inflação talvez esteja ensinando a Lula que é preciso
também "des-fazer", "reformar", "desconstruir" as causas óbvias que
a provocam, como a obesidade de um Estado com apenas 0,9% do
orçamento para investir. Lula tem de agir pelo bem do país; ele
precisa assumir o poder simbólico que tem, além do poder real de seu
imenso arco de alianças, adotar um pouco da agenda do governo
anterior.
Não há nada de "reacionário" ou "direitista" nisso. Seria um grande
bem privatizar estatais corruptas e desnecessárias, dar concessões
para aeroportos que estão prestes a acabar, salvar estradas podres,
usinas mortas, portos caros e congestionados, investir na educação
de base. Lula tem de ir além de um PAC que já está sendo corroído
pela corrupção, como o MP e a PF denunciaram (R$ 700 milhões de
fraudes já em andamento).
Por que Lula pode se aliar ao PRB, PP, PTB, PMDB e não pode se
aproximar do PSDB? Por que o Dirceu e o Berzoini não deixam? Por que
os cupins empregados temem uma mudança nas "boquinhas"?
Talvez esteja na hora de uma mudança de atitude. Sei que tudo isso
soa romântico, ingênuo, mas há um parentesco original entre
tucanismo e lulismo que pode ser resgatado. E não é apenas por
interesses eleitorais e sucessórios. É para reformar esta droga
deste país, cacete, que está um bacanal de sordidez, desmoralizando
a democracia e chamando a inflação de volta.
Além dos abraços na hora da morte, há abraços de vida.
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