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As Pérolas
Pescadas no Excremento
Toda hora ouço esta pergunta nas ruas e botequins: “E aí, seu Jabor,
como é que fica?”. “Não fica — respondo — nada se fecha na
História...”, declaro gravemente para boquiabertos negões que não
tiveram a fortuna de estudar dialética na USP. No entanto, estamos
num momento histórico importantíssimo no Brasil. Sinto uma bruta
indigestão diante de tudo que comi no ano de 2005, com o maior
escândalo de nossa História. Ando com vontade de vomitar, diante de
fatos como o daquelas vagabundas do MST destruindo 20 anos de
pesquisas da Aracruz, com o suíno barbudo do Stédile dizendo que são
heroínas, ele, criado pelos bispos ignorantes da Pastoral da Terra
(aliás, ninguém vai prender esse cara?). Tenho ganas de assassino ao
ver o Pf. Luizinho saltitante na Câmara, o Janene armando fuga com
aposentadoria, enquanto o Lula faz cara de lorde que nada sabia, ao
lado da rainha da Inglaterra. O Brasil esta virando um bolo fecal...
(desculpem as imagens intestinais, mas é o que me resta, caros
leitores). Mas sejamos “dialéticos”: vem aí uma nova fase. Não
acabou em pizza. De novo me desculpem, mas a merda foi-nos
utilíssima. Gosto muito da expressão do Oswald de Andrade “a
contribuição milionária de todos os erros”, que descreve, em outro
contexto, a forma fortuita, volúvel de o país progredir. Nunca
nossos vícios ficaram tão explícitos quanto nos últimos meses.
Aprendemos a dura verdade num congestionamento de descobertas, como
um rio sem foz, onde as sujeiras se acumulam sem escoamento.
Finalmente, nossa crise endêmica está sujamente clara, em cima da
mesa de dissecação, aberta ao meio como uma galinha.
Assim, tento fazer a lista das vantagens do esterquilínio, das
belezas do excremento, das pérolas que a lama podre revela. O Brasil
evolui de marcha a ré. Mas esta diarréia esfuziante que temos visto
grava na consciência nacional alguns insights novos que, pelo
avesso, ajudam a nos esclarecer. Vamos lá.
A primeira conquista da merda é que já aprendemos que a corrupção e
a sordidez no país não são um “desvio” da norma, não são pecados ou
crimes casuais. Já sabemos que o crime “é” a norma, que está tudo
entranhado na nacionalidade, nos códigos jurídicos, nas leis, nas
almas.
Outro avanço é que também aprendemos a mecânica da escrotidão: a
técnica de roubar o Estado para fins políticos, como os fundos de
pensão perdem de propósito no mercado financeiro, como desviam 400
milhões para bancos fajutos em troca de maracutaias, como se faz
superfaturamento em publicidade estatal, como se monta um esquema
“revolucionário” de mensalão, como se nega tudo sempre, como nada
prova nada e como depois os advogados oficiais desculpam tudo como
“caixa de campanha”. Creio que os mecanismos de controle vão se
aperfeiçoar, junto com nosso des-asnamento .
Outro grande avanço é vermos, como disse Bobbio, que nada une tanto
a esquerda atrasada e a direita visceral como o ódio à democracia.
Mais uma pérola: acabou o mito do “iluminismo proletário”, acabou a
idéia de que o “povo” encerraria uma mensagem de sabedoria e pureza.
Descobrimos com dor (uivem, populistas...) que o “povo” é fraco,
doente, ignorante e que só a educação e saúde no crescimento podem
criar o progresso. Foi importante descobrirmos que Lula, o messias
dos intelectuais, revelou-se apenas um alpinista social
bem-sucedido, competentíssimo em cinismo político e gênio do
marketing popular — o que deve reelegê-lo, já que a “economia,
estúpidos!” foi a única coisa que funcionou, surrupiada do governo
anterior, graças a Deus.
Outra pérola foi a indigência prática de tantos intelectuais
medalhões, sua falta de contato com a realidade, sua erudição vazia,
quase criminosa.
Outro bem que a bosta nos fez (o principal) foi a expulsão dos
bolchevistas desse governo e vermos que seus fins ridículos e seus
meios vagabundos não vão enganar mais tão facilmente as pessoas.
Constatamos que não foi o PT que destruiu a “esquerda”, foram as
velhas idéias de “esquerda” que destruíram o PT.
Claro que os cassados serão poucos, mas a perda de poder do José
Dirceu foi o fato histórico mais importante, pois ele era o único
líder antigo que ainda comandava a dialética da estupidez. A
permanência de Dirceu, Genoino e outros bolchevistas sem causa podia
pôr em risco as conquistas da democracia dos últimos 20 anos e
arrasar o sistema atual — sem dúvida excludente e injusto — em nome
de um “frankenstein” maluco feito de teorias do século XIX. Em 2010,
poderíamos estar diante do caos de 30 anos atrás, se o Bob Jefferson
não tivesse nos “salvado” — espero em Deus.
Aprendemos também que não há “futuro” — só uma sucessão de
“presentes” que têm de ser permanentemente enfrentados e corrigidos.
Aprendemos que “utopia” é uma palavra ridícula, e que o certo é
“planejamento”, administração do possível, projetos democráticos e
realistas.
Outra pérola tirada da bosta é a clareza de que o Estado
patrimonialista, inchado, burocrático é que nos come a vida. Todos
os críticos da economia sabem disso: enxugar os gastos públicos. Mas
ninguém consegue. Ao menos, já conhecemos melhor o “inimigo
principal”, como diziam os maoístas.
A descoberta que mais me chocou pessoalmente é que não havia um
mínimo de candura, de romantismo nos petistas que eu mesmo imaginava
“éticos”. Nunca pensei que casos tenebrosos como o massacre de
Toninho do PT e Celso Daniel seriam ocultados com empáfia, depois de
reuniões leninistas nas longas noites da Executiva.
Aprendemos, creio, que agora a modernização do país tem de ir muito
mais fundo, além da estabilidade monetária conseguida pelos tucanos,
que precisa ser formulada uma nova plataforma que dê conta da
paralisia ibérica que nos assola. Um projeto democrático mais
militante e social, com muito mais coragem para contrariar
interesses, isso, se os tucanos forem eleitos e conseguirem acabar
com o Hamlet que lhes vai na alma.
E se Lula for reeleito, só resta rezar para que não venha aí um
populismo devastador para alegrar o Chávez e ocultar sua
incompetência.
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