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               Arnaldo Jabor        

 

O Futuro Não Será Mais o Que Era
Publicado em: 23/09/2008

Nem no Capitalismo podemos mais Confiar...

O titulo deste artigo é de Paul Valéry e ganha um tom de profecia sobre as mudanças radicais de nossa época, analisadas no livro do filosofo Adauto Novaes, o excepcional "Mutações - as novas configurações do mundo" (Ed. Agir), que me estimula a essas pobres reflexões. Diante da bobeira geral, arrisco minhas profecias pois, afinal, minha ascendência começou com um remoto adivinho árabe, N´Jame ("estrela") que, segundo meus tios, previa o futuro no deserto, de camisola suja e sandálias de camelo. Vamos lá: o século 21 começou com o 11 de setembro e agora, no 16 de setembro, as torres de Wall Street continuaram a cair. Que nos acontecerá? Ou melhor, haverá acontecimentos ainda ou os fatos irão se dissolver no mar morto do futuro? Nem no capitalismo podemos mais confiar... Com a grande aceleração do espaço-tempo e da vida virtual, o aqui e o agora serão fugazes. O passado será chamado de depreciação e teremos nostalgia de um presente que não tem repouso e angústia por um futuro que não pára de não chegar. Qualquer esperança de sínteses será impossível.

O mundo vai ser fragmentário, um fluxo sem nexo, e nossa infinita mediocridade no universo ficará nua. Como poderemos ser humanos perante a ascensão incontrolável da tecnociência? Diante das miríades de fatos irrelevantes e indecifráveis, teremos saudades da perspectiva, do princípio, do meio e do fim, teremos saudades do inútil e da lentidão. As coisas que já mandam no mundo vão acelerar sua tirania. Está sendo criada uma "epi-natureza" onde o homem não mandará mais em nada , com projetos que fugirão sempre de seu controle. Será o tempo da deliciosa reificação, quando seremos felizes como coisas - previsão de Marx ao escrever : "O capital cria não apenas objetos para o sujeito, mas também o sujeito para os objetos" (li no livro...). Definitivamente, será o fim do sujeito. Os últimos resquícios dessa ilusão individual serão abolidos. No século 21, haverá apenas a mecânica operacional das máquinas, barrando toda interferência humana. Como a história será incompreensível, talvez floresçam parques temáticos de sentido (os PTS), hiper-Hollywoods, onde poderemos viver epopéias que acabam bem, harmonias platônicas teatralizadas ou grandiosas apoteoses de lógica e sentido.

Talvez criem o Museu do Ser, com bela arquitetura grega, pré-socrática, como Parthenons do espírito, com a curadoria de descendentes de Kant e Heidegger. Este mundo opaco vai gerar uma fome pavorosa de transcendência, violentas e bárbaras religiões em grandes Woodstocks do absoluto, já visíveis hoje nos showmícios evangélicos e rituais fundamentalistas. Deus, que tinha morrido, renasce nas igrejas que serão cada vez mais supermercados de esperança. Por isso, podem surgir os templos dos universais, reunindo as coisas ausentes, como disse também Valery : "Que seria de nós sem criações, fábulas, arte, mitos, crenças? Que seria de nós sem o socorro do que não existe"? Com o crescimento de acontecimentos irrelevantes e incessantes, serão inventadas drogas da câmera lenta, do vazio, do inerte, do descanso pelo tédio. Haverá campos do nada, ou melhor, spas cinco estrelas, luxuosos, para os privilegiados que poderão, por tempo determinado ou para sempre (dependendo do desespero do freguês), abolir os cinco sentidos, em busca de um silêncio sensorial absoluto, como vimos no clássico de ficção-científica "Tiger Tiger" do grande Alfred Bester.

Mergulhados em uma incompreensão total dos signos, nenhuma razão restará a não ser as razões do mercado planetário, onde vogaremos em permanentes catástrofes financeiras logo esquecidas e recuperações econômicas saudadas pela eterna esperança dos perfeitos idiotas. A política será definitivamente um espetáculo e o mundo uma grande economia sem sociedade, espalhando-se por cima dos ex-estados/nações. O caos geral será saudado como liberdade total do mercado, mas a angustiante liberdade pessoal ficará insuportável, como previu Dostoievski em "O Grande Inquisidor". As prisões e jardins zoológicos serão invadidos pelas massas, com uma grande fome de servidão e a utopia da submissão será atingida finalmente. Jamais haverá a democratização das teocracias do Oriente, como queriam os USA, em nome do petróleo mas, ao contrário, teremos um forte desejo de orientalização no Ocidente - a paz medieval. O terrorismo existirá para sempre, como um esporte radical, visto com naturalidade, como olimpíadas de homens-bomba. O corpo humano vai mudar. Os primeiros sinais já estão no silicone, nas próteses, nos narizes decepados, nas clonagens, nas transmutações genéticas. Haverá uma involução da espécie.

Por falta de interação com a natureza, os corpos vão degenerar e aspirar à condição de "aparelhos". As orelhas vão tender para celulares; os braços, para tentáculos vorazes; os olhos, para telas de cristal líquido; os paus e vaginas, para eixos e encaixes. Acabará o amor romântico. Só tesões instantâneas e fugazes. A fome de mais prazer esgotará a sexualidade e criará aparelhos eletrônicos e virtuais. Haverá hiper-orgasmos, tão fortes que viverão mais além dos limites do corpo, sozinhos - orgasmos sem carne, orgasmos gemendo no ar. A arte acabará, destruída pelos efeitos especiais. Dela, só ficarão as emoções, reproduzidas em computação: o belo, o sublime, o épico, o lírico, o trágico - bastará a programação de algum êxtase estético, mas sem obra por trás. Na América Latina, guerrilhas e ditaduras também serão parques temáticos, como viraram os "zapatistas" de Chiapas, visitados pelos intelectuais franceses. Teremos perímetros fechados de revoluções virtuais, estimulados pelas corporações, para dar vazão ao desespero e ódios, à maneira dos antigos sacrifícios astecas. Haverá o fim da piedade, o fim da compaixão e as populações miseráveis ou desnecessárias ao mercado serão exterminadas, sob os protestos inaudíveis de humanistas fora de moda. Serão chamadas de faxinas demográficas... Será o fim do fim.

 

 

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