PRIMEIRA PARTE

  Fui criado com
    Princípios Morais...

  Mulher é o que
    Impulsiona o Mundo

  Porque os Homens
    Gostam tanto de...

  Pessoas
    Inteligentes

  Evite ser
    Traído

  Não Acredito em
    Pessoas que...

  As Chuteiras sem
    Pátria

  Começo,
    Meio e Fim

  Mulheres são
    Só para Ver

  MSN e seu
    Emoticons Ins...

   CONTINUAR


  Segunda Parte

 

     CRÔNICAS


  Retornar

 

NOSSAS VISITAS


 

 

               Arnaldo Jabor        

 

As Chuteiras sem Pátria

Quando chega um fax com barulhinho de cornetas celestiais, eu já sei: é carta do
Nelson Rodrigues. Não deu outra.

Nelson me pedia para publicar um texto sobre a Copa, já que está sem contato nas redações: “Eu sou do tempo do Pompeu de Souza, do Prudente de Morais Neto... Não
conheço esses meninos da redação
...” .

Muito bem, aqui vai seu comentário sobre o sábado da desgraça:

“Amigos, a derrota é um grande momento de verdade. Só diante da vergonha é que entendemos nossa miséria. Num primeiro momento, queremos
encontrar uma explicação para o fracasso, mas fracasso não se improvisa — é uma obra calculada, caprichada durante meses, anos até.

Não adianta berrar no botequim que o Parreira é uma besta ou que o Ronaldo é um gordo perna-de-pau. Não. Nosso fracasso começou antes, porque
esta seleção não foi a pátria de chuteiras, foram as chuteiras sem pátria.

Para nossos jogadores ricos e famosos, o Brasil é a vaga lembrança da infância pobre, humilhada. O país virou um passado para os plásticos negões falando alemão, francês, inglês, todos de brinco e com louras vertiginosas.

Não são maus meninos, ingratos, não, mas neles está ausente a fome nacional, a ânsia dos vira-latas querendo a salvação. O povo todo estava de chuteiras, para esquecer os mensalões e os crimes, mas nossos craques não perderam quase nada com a derrota, tiveram apenas um mau momento entre milhões de dólares e chuteiras douradas pela
Nike.

Isso me faz lembrar o grande Neném Prancha do Botafogo: "Temos de ir na bola como num prato de comida!..." Que frase profunda, esquecida hoje... Nosso time come bem e nem os jogadores, nem os técnicos, nem os roupeiros e massagistas viram o óbvio, ali, uivando, ululando nos vestiários: o time estava sem conjunto, os jogadores estavam presos a um esquema tático que contrariava suas vocações.

Só o povo berrava: "Ronaldo está gordo, Ronaldinho tem de atuar mais livre, os jovens têm de jogar mais!". E quanto mais o óbvio se repetia, mais o Parreira se
obstinava em sua lívida teimosia... Por quê?

Porque o técnico é sempre contra a opinião geral. Em vez de orientar as vocações dos rapazes, ensinando-lhes a liberdade, a coragem e o improviso, o Parreira achou que todos têm de caber em sua estratégia. O pior cego é o surdo. E jogador brasileiro não gosta de lei nem de planejamentos, quer inventar sozinho.

O técnico devia ser um reles treinador, quase um roupeiro, humilde diante dos craques. Mas o Parreira parecia um ‘Mussolini’ de capacete e penacho. Teve vários sinais de tirania: só dava a escalação no vestiário, com os jogadores desamparados, na insônia da dúvida da convocação, não teve coragem de barrar as estrelas, como se isso fosse
uma afronta ao passado e às multinacionais.

Ronaldo fez gols, tudo bem, mas foi uma âncora pesada desde o início, em torno do qual os problemas giraram. Parreira ficou com medo dos jovens, e eu via em seus rostos o desespero do banco.

Robinho arfava de rancor e só entrava quando era tarde demais. Robinho foi o único que chorou no final, ainda menino e puro. Quem teve a mãe seqüestrada sabe o que é tragédia.

E, para escândalo do país, Robinho ficou de castigo. Ao final de tudo, Parreira disse a frase suicida: "Não estávamos preparados para perder!..." Isso é a morte súbita, isso é a guilhotina. Sem medo, ninguém ganha. Só o pavor ancestral cria uma tropa de javalis profissionais para a revanche, só o pânico nos faz rezar e vencer, só Deus explica as vitórias esmagadoras, pois nenhum time vence sem a medalhinha no pescoço e sem ave-marias.

Mas Parreira ignorou a divindade e acreditou em si mesmo, com a torva vaidade de uma prima-dona gagá, com pelancas e varizes.

Isso é o óbvio, mas foi ignorado. E quando o obvio é desprezado, ficamos expostos ao sobrenatural, ao mistério do destino. Por exemplo, por que começamos o jogo como um corpo de bailarinos eufóricos e, 15 minutos depois, ficamos paralíticos como sapos diante de cascavéis, com o Zidane dando chapéus até no Ronaldo?

Será que diante da Marselha sofremos um pavor reverencial? Em 98, Ronaldo caiu em convulsões de cachorro atropelado no vestiário. E agora? Creio que no sábado não estávamos com medo da França, não, o que tivemos foi medo de nós mesmos, voltou-nos o complexo de vira-latas, inibidos como vassalos diante do Luís XIV, de sapato alto e peruca empoada. Foi assim em 98 e agora. A França é muito chique para filhos do Capão Redondo e de Bento Ribeiro.

Mas todos sabem que quem ganha e perde as partidas é a alma. E a nossa estava dividida entre o match e a linha de passe, entre o show e a vitória. Houve o episódio da meia do Roberto Carlos, que, um segundo antes do gol da França, estava ajeitando a liga como uma madame Pompadour.

Pelé notou o descuido frívolo e trágico, pois guerreiro furioso não conserta a roupa na batalha. Esse pequeno gesto revelou bastidores de equívocos fatais, teorias e teimosias.

Outra coisa que nos matou foi a torcida. Nunca houve uma torcida tão desesperada por uns minutos de paraíso, de brilho. Foi diferente de 1950. Lá, sonhávamos com um futuro para o país. Agora, tentávamos limpar nosso presente. Explico: há um ano, somos uma nação de humilhados e ofendidos, debaixo da chuva de mentiras políticas, violência e crimes sem punição.

Descobrimos que o país é dominado por ladrões de galinha, por batedores de carteira e pelos traficantes. Por isso, a população queria que o scratch fizesse tudo que o Lula não fez. Mas era peso demais para os rapazes. A dez mil quilômetros, os jogadores ouviam os gemidos ansiosos das multidões de verde e amarelo, como uma asma patriótica. Não esperávamos uma vitória, mas uma salvação. Só a taça aplacaria nossa impotência diante da zona brasileira, a seleção era nossa única chance de felicidade. Queríamos a taça para berrar ao mundo e a nós mesmos:

"Viram? Nós brasileiros somos maravilhosos!"

Mas não deu. É só.

 

ACESSO RÁPIDO


 

Copyright ©2012 Edley Reis de Oliveira (31) 9663-1808