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Zé Ramalho

peleja de zé do caixão com
o cantor zé ramalho

                                                                  Zé Ramalho
                                             
Editora Gráfica Luna Ltda
 

A poesia popular, chamada de cordel (cordão), é muito mais difiícil de ser desenvolvida do que a poesia livre. Os versos de cordel obedecem a regras e estilos rígidos, mas não congelados no tempo, com exceção da rima que é obrigatória e não prejudica a inspiração nem a técnica do bom poeta.

Tal obediência gostosa e desafiante tem origem na poesia popular oral dos repentistas (gênios da cultura), forma remanescente da poesia medieval ibérica que chegou ao Brasil pelos portões da Paraíba em fins do século dezenove.

 A Literatura de Cordel caiu no gosto dos brasileiros, invadindo praças, casas, escolas, etc. Na Bahia o cordel chegou nos últimos dias de "Lampião" (morto em 18/07/1938 - Sergipe) quando o poeta Cuíca de Santo Amaro ("pena do inferno") já se destacava (até 1964) no revigoramento desta arte popular, intercalando fatos e coisas do sertão com temas urbanos de conotações transcendentais: casos amorosos, política, antagonismos, etc., vomitando suas criticas mordazes.

"A PELEJA DE ZÉ DO CAIXÃO COM O CANTOR ZÉ RAMALHO" foi escrita em sextilha, estilo mais tradicional usado pelos repentistas para iniciar uma cantoria: 6 versos, 7 sílabas, cujos versos ímpares não têm rima obrigatória, mas os pares devem rimar entre si. O mais difícil na sextilha (cantada) é a obrigação de pegar a deixa, isto é, a última rima deixada por um cantador deve ser a primeira utilizada pelo seu parceiro. Exemplo:

"vivemos de acreditar
no transe das gerações
a mesma nota maldita
por trás das religiões
um povo mais inseguro
escutando os tais sermões

o doutrinar dos padrões. . ."
(Página 1, estrofes 3/4).

ZÉ RAMALHO rimou com perfeição 191 palavras e somente em 15 rimas foi mais flexível o que se admite nos versos escritos, menos estéticos do que nas cantorias. Feita a análise "técnica" para melhor compreensão dos "experts", vejamos a mensagem "filosófica" deste folheto de cordel:

1. Impugna a rigidez vertical dos dogmas "castrativos ".

2. Sentencia uma verdade universal: num duelo tanto vence o perdedor como perde o ganhador.

3. O duelo entre dois repentistas é como as demais competições da vida - esportivas, políticas, religiosas, etc., que aguçam a energia criadora de ambos, cada qual extravasando sua verdade, criando seus inimigos e conquistando sua platéia.

4. A beleza pictorial abrangente espelhada nas manifestações artísticas de ZÉ RAMALHO (tanto nos palcos como nas gravações) repete-se nesta obra, a exemplo do "APOCALYPSE", publicado em 1977.

O cantor popular e cordelista José Ramalho Neto (ZÉ RAMALHO) nasceu no dia 3 de outubro de 1949 em Brejo do Cruz, Paraíba. Sua participação no disco e filme "Nordeste: Cordel, Repente & Canção", de Tânia Quaresma, fincou raízes no acervo da cultura nacional de base.

ZÉ RAMALHO ao requisitar o assessoramento do seu conterrâneo Ciro Fernandes (xilogravador), de Hildebrando Gomes (produtor) e de Ivan Cardoso (fotógrafo), decretou a perenidade deste livreto de cordel.

Rio de Janeiro, junho de 1981. Raimundo SANTA HELENA Poeta de cordel, presidente da COORDEL-RIO e Divulgador Cultural da Ordem Brasileira dos Poetas da Literatura de Cordel

Peleja de Zé do Caixão
com o cantor Zé Ramalho

                                                                
Zé Ramalho
a consciência do homem
tão cheia de julgamentos
aplaude quanto condena
o povo nesses momentos
um doutrinar inseguro
no poço dos pensamentos

as normas dos tratamentos
o jeito de se comportar
um medo dos preconceitos
de quem quiser se educar
um cadafalso maduro
em cada praça e lugar

vivemos de acreditar
no transe das gerações
a mesma nota maldita
por trás das religiões
um povo mais inseguro
escutando os tais sermões

o doutrinar dos padrões
que tanto se apregoa
impede o dom dos instintos
que dentro sinta uma boa
desrepressão do mistério
que fere fala e magoa

um deles não vai à toa
nem na direita vai dar
nem outro lá na esquerda
tem planos de se salvar
na sua grande opção
nas horas de pelejar

isso é o modo de opinar
onde fomos competir
nos colocaram no ato
de cantar e distrair
colegas e inimigos
foi só o que eu consegui

mas nunca me convenci
que é essa a afirmação
que traz a felicidade
em prol da competição
dos companheiros legítimos
que vou contar uma lição

a peleja de zé do caixão
com o cantor zé ramalho
foi grande acontecimento
mexeu com todo o baralho
as forças deles se uniram
para fazer um trabalho

não houve nenhum empalho
durante a conversação
ramalho disse pro zé
pode pegar o caixão
que eu vou buscar a viola
e trato da afirmação".

o motivo e a razão
desse encontro medonho
foi uma capa de disco
que tem um valor tamanho
pela sua grande mensagem
no seu visual estranho

e seja quem tiver ganho
no final dessa história
lhe digo que foi incrível
o que ficou na memória
as cenas se sucederam
todas cobertas de glória

o diabo tem na escória
a sua grande torcida
e ela aqui se defronta
com a peleja da vida
o outro lado do negro
e o branco mar da saída

o homem tem a partida
o disco tem sua capa
o canto tem compromisso
e nenhum deles escapa
do simbolismo existente
em cada canto do mapa

pode aperrear o papa
ir de encontro aos querubins
incomodar em distúrbios
intestino pés e rins
interessar o governo
a consumar os seus fins

mas josé mojica marins
é um grande ser artista
que fez de um personagem
seu forte ponto de vista
um homem que encara a morte
com uma visão realista

pro povo mais populista
que queiram analisar
o diabo é algo assim
crendice bem popular
exu de barba e capote
e unhas para agarrar

e se o diabo vem cantar
contra um dono do céu
que é o nome de um tal disco
envolto em paz e véu
os dois bons personagens
irão sentar-se no réu

e entre o mal e o fel
tão conhecidos no mundo
serão eles violeiros,
num pelejar mais profundo
não haverá vencedor
e nem final moribundo

e seja quem for mais fundo
já deu para perceber
o que o nosso zé do caix‹o
irá na capa fazer
um diabo bem cavernoso
na pele dele descer

e se isso acontecer
não tenha medo irmão
é ele próprio o mojica
mantendo a encarnação
de unhas garras e barbas
de capa preta e bastão

conhece com perfeição
cada segredo do mapa
de qualquer uma família
cidade nação ou lapa
conhece todas histórias
de cada ser que ele rapa

de mim é que não escapa
de todos meus sentimentos
que é coisa que os cantadores
empregam nesses momentos
escudos de energia
que aguçam seus pensamentos

tem ele conhecimentos
tem fogo pelos cabelos
as garras sujas de sangue
e o ódio nos cotovelos
e seus rugidos acusam
a raiva que tem nos pêlos

nesses fins de novelo
a calma vem controlada
pois o diabo não avisa
quando dará uma chifrada
o cheiro do seu enxofre
deixa a alma envenenada

mas quem faz a empreitada
com luzes do improviso
merece ser repentista
que fala com mais juízo
das coisas que o mundo teme
do gozo e do paraíso

pois pro diabo é preciso
dar um grito furioso
que levantou toda a relva
que grito mais pavoroso
e o cantador se prepara
para enfrentar o tinhoso

nesse momento grandioso
que tem filosofia e fama
verá que dois cantadores
a nenhum deles exclama
e o povo se junta em volta
para ouvir quem reclama

saiu fogo da grama
pois zé do caixão se aprontou
para ouvir os repentes
que o zé ramalho aprontou
em versos milimetrados
com toda força cantou:

R - eu vim porque Deus mandou
cantador sou do sertão
sei tirar fogo do frio
sei domar a escuridão
e quando eu faço o meu repente
espalho fumas no chão

D - pois diga seu sabidão
que a sua força é mentira
por duas vezes somente
a sua voz me atraíra
a provocar-me mistérios
que soltarão minha ira

R - eu tenho-o na minha mira
seu meio-rosto e seu passo
vou danar-lhe meu repente
nas costas, no espinhaço
que vou fazer de você
um monturão de bagaço

D - esse cabra é um fracasso
vou mandar a sua conta
abra os olhos vagabundo
pois o diabo quando apronta
leva todos pros infernos
e somente ele amedronta

R - você só tem a desconta
dos coitados inocentes
que sofrem pelos pecados
das suas almas dementes
vendidas pelos degredos
das tuas mãos indecentes

D - esses versos prepotentes
para mim soa à elogio
pois todos sabem que faço
do meu reinado sombrio
pessoas sofrendo horas
passarem sem calafrio

R - vou queimar o teu pavio
mais cedo do que tardar
e essa tua cara tão feia
com medo vai se virar
no branco desses defuntos
que ninguóm pôde enterrar

D - esse teu matraquear
só sai da língua pra fora
pois o homem que é do céu
nunca me meteu a espora
e se eu me agarro com ele
com medo de mim implora

R - quero ver se a sua hora
virá dizer o seu fim
se com o outro foi mais fácil
comigo será ruim
se estou de frente pro diabo
e ele de frente pra mim

D - distante estou de Caim
espere eu me apoquentar
se eu já derrotei o céu
imagine o seu cantar
que não traz força nenhuma
nem poderá derrubar

R - isso é que vamos trocar
no meio da discussão
deixemos outros de lado
e vamos a nossa questão
que eu já estou de saco cheio
de tanto the dar atenção

D - ora vejam se há razão
desse cabra me enfrentar
com todos enxerimentos
já dei em dez sem cessar
e imagine um fraco desses
vir aqui me aviltar

R - eu vim aqui pra lhe dar
castigos que bem mereces
você não é um sabido
e nem tudo que conheces
e o povo tá assistindo
à surra que tu padeces

D - você não me oferece
a contenda que eu preciso
meus olhos queriam ondas
de carnes no paraíso
e voltam as minhas sombras
no dia do meu juízo

R - vou lhe dar último aviso
cabra ruim mal e nojento
você não tem outro ofício
que não seja um avarento
ladrão de almas penadas,
o mais vil dos sentimentos

D - não tolero esses momentos
vou daqui me retirar
vocês não deram ouvidos
às coisas que eu vim contar
mas foram tão arredios
que o diabo vai castigar

R - você não vai desfilar
nos álbuns da nossa vida
nem almas verão teu rastro
não mais serão perseguidas
só vamos ver a surpresa
de quem venceu a partida

o diabo faz na medida
um rasgo de fabulagem
foi louco que deu a vida
no poço da vadiagem
um parto de malefício
no porto da malandragem

e seu eu cumpri a mensagem
que o dono do céu me deu
um pouco da sua força
em minha frente desceu
em partes mais dominantes
por atos que ofereceu

e se o diabo não morreu
nada disso mais importa
pois ele foi imperfeito
e do meu lado ele não corta
e se não gostou do meu canto
ali mesmo ele aborta

 

    

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